domingo, 11 de dezembro de 2011

Rumo ao desastre - I

Terminou mal a Cimeira de Durban. Ao contrário das anteriores cimeiras climáticas, quase não se ouviu falar desta. Também ao contrário das anteriores os chefes de estado mandaram as terceiras linhas e muitos dos maiores poluidores do mundo procuraram diminuir os compromissos já assumidos em relação à redução de emissões.

O contexto da crise financeira actual torna menos mediática e menos central a discussão sobre o futuro mas os problemas não vão desaparecer ou adiar-se por causa disso, apenas a sua solução. No fim prolongou-se o protocolo de Quioto, que terminava no próximo ano e isso foi o melhor que se conseguiu. De certeza que o próximo será para reduzir compromissos e não para os reforçar.
Enquanto isso o planeta vai rumo a um aumento de 3 ou 4 graus de temperatura média até 2100 e 6 a 7 em algumas zonas do planeta. Caso se apertassem as medidas podia-se ambicionar uma subida de 1,5 a 2 graus, o que resultaria num impacto negativo muito menor. Rumo ao desastre, nada contam os fenómenos climáticos cada vez mais extremos mundo fora; Nada contam os países isolados no meio do oceano que irão desaparecer, a desertificação acelerada de zonas do planeta  já hoje deprimidas e miseráveis e nada contam  até aquelas evidências claríssimas que acontecem já hoje, como por exemplo as recorrentes grandes inundações do Oeste Asiático (lembram-se que parte da Tailândia esteve debaixo de água durante meses, este ano?).




A crise financeira que enfrentamos é muito grave e é um grande desafio global, mas há problemas de longo prazo que, se deixarmos de lutar contra eles se transformarão em crises muito mais profundas que a actual. Na economia, quando há défice a aumentar, acumula-se dívida. Além dos factores de especulação financeira, foi isso que nos colocou onde estamos. Desde 1986 o conjunto agregado dos recursos naturais é consumido acima da reposição natural. Falamos portanto de défice planetário ao nível dos recursos naturais.
Essa também será uma dívida que passará para as próximas gerações, com a diferença que nem com medidas de emergência se conseguirá pagar. A subida do nível do mar, a perda de biodiversidade, a escassez de alguns recursos e os fenómenos climáticos extremos terão um impacto na vida das pessoas, com destruições inimagináveis e um efeito no PIB, dezenas de vezes superior ao efeito da actual crise. Faça-se com esta futura crise, o que se fez com a actual ignorando-se as evidências em tempo útil e veremos…

Uma nota final para dizer que nisto tudo a Europa não sai mal pois tem compromissos assumidos superiores ao protocolo de Quioto. Infelizmente fazermos o que está bem não nos dá garantias de não sermos afectados pelos problemas, mas é importante que o façamos, pois o mal dos outros nunca deve ser justificação para que não façamos as coisas certas e acima de tudo isto cria pressão e condições negociais para se procurar que outros o façam também. O problema do clima é o mais global de todos e só acções concertadas poderão mitigá-lo.

Faltam líderes cuja visão vá além do fim da sua rua…

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Pseudociência

Há poucos dias vi na SIC uma reportagem, creio que no Jornal da Noite, sobre um rapaz Brasileiro que atraía objectos. Falava-se em magnetismo e claro, mandava-se para o ar a incapacidade da ciência explicar. Em vez disso devia ter-se falado em pré-adolescência e em falta de tomar banho.

Não houve qualquer preocupação da SIC em ouvir alguém que pudesse esclarecer o assunto, só a notícia para alimentar a propensão que já existe, a estas coisas milagrosas e misteriosas que, sendo raras, acontecem sempre por aqui e por ali.

O blog AstroPT.org editou uma revista sobre Pseudociência onde aborda muito exemplos e explica também como se deve proceder para inventar uma destas tretas.

http://astropt.org/blog/2011/07/20/pseudomagazine-edicao-especial/

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A RTP, o serviço público e as aldrabices

O novo Governo afirmou que a RTP iria ser privatizada. Em abstracto tendo a achar um erro. Enquanto a televisão continuar a ter um papel tão central na vida da maior parte das pessoas penso que há lugar para pelo menos um canal onde a programação tenha uma preocupações que vão além dos critérios comerciais.

Passei muito tempo no Reino Unido e vi bastante a BBC. Também na BBC há algum lixo pouco compaginável com o que se chamaria serviço público. Mas proporcionalmente à RTP é pouco e parece-me que é meramente uma consequência de uma linha editorial que, uma vez delimitada, tem grandes graus de liberdade. Observei reportagens de grande nível e verifiquei que nas mesmas está quase sempre presente um "sentido de serviço ao público", por exemplo procurando tratar temas científicos complexos como a maior simplicidade possível ou desmascarando aldrabices ou desmistificando ideias enraizadas e que não fazem grande sentido. Muitas das melhores séries a nível mundial sobre a Natureza, a Cultura, a Ciência são da BBC. Várias dessas séries não existiriam se os critérios fossem apenas os da racionalidade financeira, pois apesar do peso mundial da BBC, duvido que os elevados custos de alguns desses programas sejam pagos pelas audiências dos mesmos. A definição difusa do chamado serviço público torna-se clara quando se analisa a BBC.

Não esperaria naturalmente que a RTP atingisse este nível na produção de conteúdos. Seriam demasiado caros para um mercado como nós. Mas esperaria ao nível da linha editorial da produção efectuada uma atitude semelhante. Embora a situação o merecesse, não vou tecer comentários em relação ao carácter mais ou menos popular de alguns programas da RTP, tipo os vários programas das manhãs, o Portugal no Coração, o Preço Certo e outros. Posso até admitir que estes programas façam parte do mix necessário para atrair uma audiência suficiente, passível de ser fidelizada e que possa depois consumir outros conteúdos, ditos de serviço público.
No entanto questiono fortemente certos programas, rubricas ou reportagens. Mesmo não descendo tão baixo quanto outros canais, onde por exemplo se passam horas a falar com os mortos, há na RTP uma presença regular de astrólogos, tarotólogos, medicinas altenativólogos e outros aldrabólogos.

Até se podia perceber a presença desta gente, se fosse para discutir de forma séria e com contraditório, a fonte da sua sabedoria, os seus diplomas, os fundamentos, as provas científicas da mesma e os resultados comprovados mas não, dá-se-lhes tempo de antena como se houvesse qualquer fundamento para a sua banha-da-cobra.

Exemplos disto recentes: Já referi num post anterior um convidado do Nicolau Breyner especialista em medicina energética isto em Prime Time numa 6ª à noite; Ainda mais recentemente, o homeopata (há quem chame homeopatetice) Nuno Oliveira teve direito a 30 minutos no Portugal no Coração, onde os apresentadores o trataram quase efusivamente e se calhar até de foma mais entusiástica do que se tivessem chamado um médico a sério, como um pediatra ou de clínica geral – O que pensarão as pessoas que vêm um programa destes e contactam com uma medicina tão milagrosa, sem contra-indicações, barata, garantida. É fácil pensar que no dia seguinte, os consultórios dos homeopatas vão estar mais cheios, e as farmácias que vendem xarope de água e comprimidos de açúcar, mais ricas. Mas esse é o menor dos efeitos. O pior é que há quem fique convencido que pode passar a tratar infecções sem antibióticos e cancros sem os tratamentos adequados, etc. Isto é portanto muito mais grave que a simples negligência informativa.

Dentro deste campo de abordagem da RTP por terrenos pantanosos inserem-se ainda coisas como a presença regular da astrologia,como rubricas de programas ou o privilégio que é dado à religião católica que tem uma presença muito mais frequente que as outras confissões com a transmissão de missas semanais, ou com as muitas horas de transmissões de Fátima, Vaticano, etc.

Como deveria a RTP agir perante este tipo de situação?

Um bom princípio jornalístico é o da neutralidade. Mesmo que os enviesamentos pessoais dos jornalistas sejam inevitáveis, tentar pugnar pela neutralidade permite não embarcar pela maioria, ir ao fundo da questão, procurar ângulos diversificados, dar voz às minorias, etc. No entanto neutralidade não pode ser entendida sempre como equidistância. Não se coloca em pé de igualdade o criminoso e a vítima; Não se dá o mesmo peso ao racista e ao defensor da igualdade; não se mete no mesmo saco a opinião do especialista e a do curioso, mesmo que cada uma possa e deva ter o seu espaço; não se trata a química no mesmo pé que a alquimia ou a medicina no mesmo plano da possessão demoníaca, etc, etc.

Há padrões civilizacionais e culturais que, mesmo sendo evolutivos e marcados pelos tempos em que vivemos, definem referenciais e pontos de partida. Diria assim que, em temas que envolvem conhecimento o jornalista não pode dar o mesmo peso àquilo que passou pelo crivo metodológico dos especialistas como o método científico e aquilo que se apresenta como verdade revelada, filosofia de vida, opinião, etc. Diria o mesmo se se comparasse uma sentença judicial a uma opinião de circunstância.

Isto significa que perante um dado problema há que privilegiar aquilo que está amplamente comprovado, rejeitar o que também está comprovado não funcionar e naquilo que é menos certo, dar peso à posição mais consensual dos especialistas, a mais testada, a mais comprovada pelas evidências, pelos testes, pelos modelos explicativos. É certo que há posições mais alternativas que poderão estar correctas, mas para atingirem um estatuto onde mereçam ser consideradas têm que ser testadas e percorrer o mesmo caminho que as mais consensuais.

Por isso quando se fala com alguém que tem uma explicação extraordinária para algo, há que pedir provas e que estas não sejam apenas exemplos e testemunhos, cujo rigor não se pode atestar. Testes controlados, confirmação por pares perante circunstâncias idênticas são critérios absolutamente fundamentais para que um carro ser vendido, ou a farinha do pão possa ser usada. Só se pede um critério semelhante naquilo que a RTP trata como conhecimento nos seus programas e pede-se também que, na sua missão de serviço público desmascare os aldrabões, os pseudo-médicos, os curandeiros, os místicos e outros que tais. Ou que pelo menos não lhes dê relevo.

Para quando reportagens como esta da BBC em que aborda precisamente o tema dos milhares de curandeiros que pululam por aí?

quarta-feira, 8 de junho de 2011

O telemóvel e o cancro

Na semana passada correu a notícia de que, segundo a OMS, a utilização dos telemóveis poderia causar o cancro. O assunto das radiações é recorrente na opinião pública. Faz parte dos “demónios” que agitam temores na sociedade de tempos a tempos, para o qual há sempre uma grande propensão para se distorcer ou ampliar as conclusões dos estudos.
 
A verdade é que a utilização intensa de telemóveis tem mais de 20 anos e não se assistiu a nenhuma pandemia. Pelo contrário, segundo o New York Times, os níveis de cancro do cérebro têm vindo a descer nas últimas duas décadas. Há muito que se fazem estudos sobre campos electromagnéticos e nunca foram encontradas evidências de que radiação não ionizante de baixa potência, como a dos telemóveis, quebrasse ligações químicas ou alterasse o DNA.

De qualquer modo a OMS é uma entidade credível e aliás, ainda no ano passado, publicou um amplo estudo de 14 milhões de dólares, realizado em 13 países que mostrava não existirem evidências de que os telemóveis tivessem efeitos carcinogénicos. O que mudou desde então? Um painel de cientistas da Agência Internacional para a Investigação do Cancro (IARC), órgão consultivo da OMS, analisou alguns dados novos e encontraram uma associação (não uma relação causal) com um tipo específico de cancro, o Glioma. O que significa esta associação? Há uma classificação utilizada que graduar os efeitos:

Grupo 1 – Cancerígeno para humanos

Grupo 2A – Provavelmente Cancerígeno para humanos

Grupo 2B – Possivelmente Cancerígeno para humanos

Grupo 3 – Não classificável quanto à carcinogenicidade para humanos

Grupo 4 – Provavelmente não Cancerígeno para humanos

As radiações foram classificadas no nível 2B, onde constam por exemplo coisas como o café ou os pickles. Foi uma aplicação do princípio da prudência, porque este tipo de cancro é bastante agressivo, mas parecem no entanto existir alguns problemas metodológicos no estudo, pois no geral a conclusão aponta para que as radiações dos telemóveis diminuem a incidência global de cancro no cérebro, o que obviamente não parece ser uma conclusão credível.
Diria portanto que há aqui alguma precipitação e uma distorção na mensagem, por parte de alguns Media. Falar-se com certeza de coisas de que não se têm certezas, sem que haja um potencial negativo iminente, é perigoso. Por exemplo em 1998 um Gastroenterologista Britânico afirmou haver uma relação entre a vacina Tríplice (Sarampo, Rubéola e Papeira, que é administrada aos bebes até aos 12 meses) e o autismo. Nos meses seguintes, tal foi amplamente divulgado na imprensa e o médico elevado a herói por ter encontrado uma relação desconhecida numa doença assustadora. Os níveis de adesão à vacina caíram para 70%. Em 2006 morreu a primeira criança em décadas de Sarampo, no Reino Unido. Em 2011, 334 casos aconteceram e em França 7000. O médico foi desacreditado e punido. O autismo ficou igual, mas o efeito do passa palavra ainda se manifestará por muito tempo.

Diria em conclusão, que o histórico de utilização do telemóvel nos pode tranquilizar e certamente não há razões para pensar em nada de grave, pois em 5000 milhões de telemóveis a nível mundial, os efeitos seriam claramente visíveis. Se se vierem a provar definitivamente relações causais serão raras e de pequeno impacto. Certamente que o telemóvel salva, muito mais do que mata, se é que mata alguma coisa. Ainda assim é naturalmente um assunto a continuar a estudar. Da da minha parte não estou nada intranquilo… e não é por trabalhar num operador de telecomunicações! Não conheço nenhuma prova física de que este tipo de radiação destrua moléculas e os estudos estatísticos parecem ainda ter muito ruído nos dados. Estou certo que numa análise de metadados, no agregado dos vários estudos se tirarão em breve conclusões sólidas e que certamente corroborarão a falta de evidência física de que fotões deste tipo destroem ligações na química das células cerebrais.

É sempre bom procuramos conhecer melhor a realidade. O conhecimento só ajuda a afastar os anátemas gerados pela ignorância.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

A política e a realidade...

A nossa preferência ou rejeição por um dado partido é influenciada por muitos factores. Desde aspectos ideológicos, alinhados ou em oposição com o modelo que nos parece melhor para a sociedade, até à identificação com um líder ou líderes, passando por aspectos culturais e educacionais que nos moldaram a preferência ou focando as nossas razões em análises mais pragmáticas e circunstanciais relacionadas com o desempenho real das propostas de um dado partido. Tudo isso nos leva a uma escolha, que às vezes é apenas uma aproximação ao que gostaríamos.



A política é uma disciplina de extrema importância, por muito que a prática dos políticos nos afaste da mesma. Mas o homem político é um conceito associado ao funcionamento da polis (cidade-estado), generalizado depois para qualquer forma administrativa existente na sociedade. Portanto, todos somos Homens políticos sempre que damos o nosso contributo funcional para a sociedade onde nos inserimos.
Dito isto, na forma como os órgãos de soberania exercem os seus poderes, há demasiada política. Por exemplo escolher onde fazer um investimento tem uma forte componente política, mas esta não deve confundir-se com a análise técnica que analisa o custo benefício do mesmo. Esta confusão acontece muitas vezes! Há muitas situações que são de natureza técnica e que são analisadas logo de raiz, numa lógica política e isso é um erro. A política não deve estar onde os problemas são técnicos e estes são-no quase sempre e só depois (e nem sempre) se tornam políticos.

Escolher quantos anos deve ter o ensino obrigatório é uma opção política, definir o conteúdo do programa de matemática é um problema de natureza técnica. Escolher se as linhas do TGV devem ser A ou B é uma opção política, saber as opções que oferecem mais dificuldade de construção ou quais as mais rentáveis são questões técnicas. Determinar a sustentabilidade da segurança social é um problema técnico, optar por uma dada solução é exercer política. Esta distinção é importante, porque se as análises técnicas forem idóneas e se a decisão política for essencialmente marcada pelo racionalidade e fundamentada nas melhores evidências, então não devem existir tantos graus de liberdade na escolha política. Não é isto que vemos no dia-a-dia em que o mesmo problema se defende com um argumento e o seu contrário, conforme a conveniência.

Não estou com isto a defender uma lógica tecnocrática da governação. Ou melhor, estou, mas apenas nas áreas em que há saber robusto e indicadores claros e sempre com o sentido do bem comum em mente, o que não é normalmente a perspectiva do tecnocrata.

A administração central de um país deveria assim centrar os seus recursos na análises dos pareceres técnicos, dos indicadores internacionais e em como nos comparamos com eles e, com base nos desvios fazer as suas opções e apostas, em conformidade com as prioridades e metas definidas no programa do partido que foi apresentado às eleições. Na verdade, o que temos são ministérios a interferirem em exames escolares, em sustentações terapêuticas para financiar ou não um dado medicamento, etc. Isto reflecte misturas indesejáveis e torna qualquer acção muito difusa e pouco compreensível, excepto para especialistas que consigam avaliar a sustentação ou não das opções.

Esta dificuldade, em se compreenderem as opções de execução, por não se vislumbrar a fundamentação técnica, afasta-nos como cidadãos dos decisores políticos e dos níveis de intervenção que seriam desejáveis. A retórica política faz parte do jogo e é inevitável, mas num contexto nubloso deste tipo, assume proporções graves e geradoras de uma ainda maior desmobilização.

Se olhar para os vários planos estratégicos  das empresas onde trabalhei verifico uma clareza nos princípios estratégicos que se perseguiam, uma alinhamento dos objectivos com os mesmos e, acima de tudo, um plano e metas perfeitamente mensuráveis, que permitem não só criar alinhamento de toda a organização, como avaliar a progressão e adoptar correcções rápidas no caso de desvios. Um país não é uma empresa, mas não há razão nenhuma para, nesta dimensão, não se aproximar deste tipo de práticas, o que deveria começar com os programas com que os partidos se apresentam às eleições. Estes deviam ter bem claras as opções estratégicas, e ao detalhe técnico deviam juntar-se versões resumidas com metas claras e bem definidas no tempo. A execução do programa seria assim fácil de acompanhar, por simples confrontação da evolução dessas métricas com o que estava definido nas metas programáticas.
Não existir esta clareza nos programas e não se clarificarem as fundamentações das decisões em pareceres técnicos validados pelas instituições mais idóneas, só nos faz ignorar a realidade dos factos. Um sintoma muito evidente disso, ou não estivéssemos a 2 dias das eleições legislativas, é o que se passou ao longo desta campanha, em que não se discutiu quase nada de forma fundamentada e compreensível.

A verdade porém existe, independentemente das nossas opiniões e preferências pelo partido A ou B, e basta lermos o memorandum assinado com a Troika para, não só encontrarmos as metas que faltam nos programas dos partidos como aí constatarmos que há um conjunto dessas metas, com grande impacto nas nossas vidas que irão já começar a acontecer a partir de Julho independentemente se ser o PS ou o PSD a ganhar as eleições. E mal de nós se começarmos logo a não honrar o que assinámos há pouco. O tempo da negociação acabou! Concordemos ou não com o que foi acordado, independentemente do que achamos sobre os culpados e sobre o que teria acontecido se… agora é tempo apenas para executar. E seria bom que todos estivéssemos conscientes disso para votarmos em plena consciência sobre o que nos espera e sobre o quadro político que queremos ter na execução dos compromissos assumidos.
Seria também bom percebermos que não votar ou votar em branco são apenas formas de alheamento de uma escolha, que vai ser feita de qualquer maneira. Mesmo que tal, possa aliviar a nossa revolta com “estes políticos que não nos merecem”, com o sistema, com a injustiça, no dia 5 de Junho vai ser eleito um novo parlamento.



O governo, o parlamento, as administrações locais são instituições, mas o que é isso senão dizer que são feitas por pessoas como nós e é em nós que temos que encontrar soluções para os problemas que nos afectam, o que começa obviamente pelo voto. Esta é a crueza da realidade quer gostemos ou não e, ou nos assumimos como protagonistas, com capacidade de fazer a diferença ou seremos a vida inteira meros espectadores de uma vida governada por um destino que alguém define por nós…

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Uma teoria científica não é opinião

Irei abordar por aqui o conceito de teoria científica, tantas vezes apontado como uma fragilidade da ciência, uma vez que as teorias mudam e se são teorias, não são leis. Esta é uma perspectiva profundamente deturpada, pois essa capacidade de mudança é uma das principais virtudes da ciência, mas isso fica para outra altura.

Por agora fica uma visão artistica desta ideia, através dos They Might Be Giants, um grupo Americano da década de 80 ainda no activo hoje, que tem diversas canções, 3 numa escala de 5 a nível artístico, cuja particularidade é focarem-se muitas vezes numa mensagem científica.

Irei colocar várias das suas canções aqui. Esta é a primeira e escolhi-a não por ser a melhor, mas porque fala do que é a ciência e nas suas bases.

terça-feira, 24 de maio de 2011

A Apple e a religião

Um recente documentário da BBC – Segredos das Supermarcas – apresentava diversas conclusões sobre o funcionamento do cérebro, obtidas com base em imagens de Ressonância Magnética, que evidenciavam que os produtos da Apple e de outras Supermarcas geravam para os fãs mais fervorosos dessas marcas, um estímulo nas mesmas zonas do cérebro, que os símbolos religiosos produziam nas pessoas crentes.
É interessante, mas não é surpreendente esta conclusão! Se observarmos os comportamentos do dia a dia, vemos que há ligações poderosas e que são por vezes marcadas por muita irracionalidade. É inútil contrapor vantagens do Windows ou Linux, a um superadepto do Mac OS. É inútil tentar explicar que aquele golo entrou mesmo um metro na baliza, a um fanático da equipa oposta. É tarefa quase inglória tentar demonstrar que não há evidências da existência de Deus, para um zelota da fé.
Este estado de semi ou completa irracionalidade é algo a que as marcas aspiram e muitas investem toda uma estratégia de Marketing, na construção de uma ligação mais centrada em associação de estilos de vida ou de pertença a um grupo ou credo.

Por exemplo uma marca que consegue gerar uma legião de fãs, que chegam a tatuar permanentemente o seu símbolo no corpo, tem certamente no mercado vantagens, sobre aquela marca que vende produtos de reconhecida qualidade mas que são incapazes de gerar paixões, resultando algo anódinos perante tão forte ligação emocional. Nada que as religiões não explorem há séculos, embora aí entrem factores adicionais, como o medo ou a ideia de pecado, que são factores com um potencial manipulador mais elevado, mas que estão vedados às marcas.

Mas porque é que existem este tipo de comportamentos? E porque é que é tão frequente, mesmo em pessoas esclarecidas e inteligentes, acreditarem em explicações metafísicas, sobrenaturais, transcendentes, religiosas? Bruce Hood, Professor e Director do Centro de Desenvolvimento Cognitivo da Universidade de Bristol, apresenta algumas explicações no seu livro – Supersense: Why we believe in the unbelievable. A Evolução parece ter dotado os seres humanos de um sentido de procura padrões, que lhe garantiu vantagens competitivas na forma como superou dificuldades e se antecipou a ameaças, mas que deixou resíduos na necessidade de um propósito e, em consequência, na procura de figuras de messiânicas, com autoridade e com capacidade de serem uma referência e nos guiarem.

Parece assim que o sobrenatural é muito natural, pois esse maravilhoso órgão de 1500 gramas, que nos consome mais de 20% da nossa ração diária de energia, tem uma complexidade que só recentemente começámos a sondar. Isso não quer dizer que nos devamos render a essa natureza, pois esse mesmo cérebro também encerra em si capacidade de racionalização, que nos trouxe o desenvolvimento e conhecimento actuais. Há pois, que olhar as coisas com uma perspectiva racional, pelo menos em assuntos mais importantes do que a preferência por uma dada marca ou clube e não aceitarmos sem evidências fortes, as explicações que nos derem, principalmente quando estas forem extraordinárias e sem grande aderência ao que observamos no dia a dia.

Termino com uma Ode a esta massa cinzenta que, com o tempo, será certamente capaz de se desvendar a ela própria!

sábado, 14 de maio de 2011

Espiritualidade

Aproximo-me de casa, já noite feita. Não entro, fico cá fora. Está tudo muito sereno. Corre uma leve brisa, suficiente para fazer girar o aerogerador, mas sem força que leve as pás a fazerem-se ouvir. Na penumbra vislumbro vultos. Deixo adaptar a retina e já consigo perceber que são as ameixoeiras, as macieiras, um pouco mais despidas, e os sobreiros, bastante mais imponentes. Contorcem-se numa dança. Uma dança muito suave, pois a brisa não as deixa expressarem-se como estão habituadas. As árvores do Oeste estão habituadas a coreografias violentas, mas hoje não!

Uma miríade de sons modela uma paisagem sonora. Nesta orquestra telúrica, a coruja faz de barítono, os sapos – muitos sapos mesmo –, assumem uma preponderância de tenor. Vêm de várias direcções, como os grilos, que também não deixam distinguir de onde se manifestam. Cães, ouvem-se também vários e, apesar de mais longínquos, é fácil perceber as origens. Não há muitos sons femininos nesta construção sonora, mas ao longe, ainda consigo distinguir um meio-soprano. Parece-me uma cotovia. Enfim, não sei se é uma cotovia; não sei mesmo se sei como é o som da cotovia. Mas quando os meus filhos eram bebés cantava-lhes uma canção –“…ao luar, canta a cotovia…”.

Está um belo luar, logo é uma cotovia… Sim, está mesmo um belo luar! Não está céu limpo, as nuvens são até bem elaboradas, mas há muito céu livre, que deixa a descoberto uma estrondosa lua em quarto crescente. Esta, já a caminho da lua cheia, enche-se de brios e vai brilhando como se já lá tivesse chegado. Vaidosa, esta lua! Tão perto, que mesmo sem luz própria, se sobrepõe às fornalhas nucleares das estrelas e não lhes dá muitas oportunidades de se deixarem ver. Mas de vez em quando, as nuvens densas abafam-lhe o esplendor e aí, olhando para o lado oposto do horizonte, consigo ver muitas estrelas. Uns minutos a adaptar o olhar e já são muitas centenas. Talvez até Milhares. Apesar de tudo não é das noites melhores para se ver a Via Láctea em todo o seu esplendor, mas o que se vê já é deslumbrante.

Espiritualidade é isto! É esta a transcendência que o Cosmos nos oferece. É fácil pensarmos num criador! É difícil pensar que não houve criador! Mas… será mesmo?


sábado, 7 de maio de 2011

Conhecimento não é opinião!!!

Há uns anos um amigo Australiano falou-me de um comediante do seu país de que ele não era um grande fã, mas que achava que se alinhava bastante com o meu sentido de humor - palavras dele. Desde então tenho acompanhado Tim Minchin em várias das suas performances (pela net). A peça que aqui coloco chama-se "Storm" e pertence a um dos seus espectáculos. Está disponível na versão ao vivo e esse texto deu agora origem a uma versão animada, que é bastante elucidativa em relação a alguns princípios científicos e à forma de distinguir conhecimento de opinião.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Medicinas Alternativas

Na 6ª feira passada estava a fazer zapping e deparei com o programa do Nicolau Breyner, "Nico à Noite". Nunca tinha visto, mas estava por lá o Medina Carreira que, num tom algo diferente da amargura habitual, dava uma entrevista mais pessoal e por aí fiquei. Seguiu-se um tal de Dr. Nuno Nina, compadre do Nicolau Breyner e licenciado em medicina bioquímica. A coisa cheirou-me a esturro, mas esperei para ver.
A entrevista só confirmou a minha primeira impressão. Tanto a medicina, como a bioquímica são coisas sérias e muito respeitáveis e até estão ligadas profundamente, mas não conhecia nenhuma licenciatura que juntasse as duas no nome e pareceu-me a estratégia típica dos vendedores de banha-da-cobra, que consiste em usar uma linguagem sofisticada e pseudo-técnica.
Umas investigações na net à posteriori, sobre o tal Dr. Nuno Nina permitiram-me concluir que a sua pretensa licenciatura não é reconhecida em Portugal (e provavelmente em lado nenhum!) e que a sua medicina é recheada, como seria de esperar, de outros epítetos: Electromedicina; quântica; energética; integrativa; informacional.

Tudo coisas lindas e impressionantes, com o único problema de não quererem dizer nada de relevante e de misturarem conceitos que fazem sentido em determinados contextos, mas são completamente disparatados noutros.
Tudo o que é quântico está na moda, desde as pulseirinhas à homeopatia. Se se diz que a ciência não explica e quando não há quaisquer evidências de sucesso que se distingam do efeito placebo, em testes sérios e com as regras que se utilizam universalmente para validar qualquer terapia, então de certeza que há uma misteriosa explicação quântica à espera de ser usada.

Falarei disto mais vezes, pois a Física Quântica é uma coisa séria e de grande importância e com presença no nosso dia a dia, mas aqui o essencial da mensagem que pretendo passar é que isto é perigoso e não sei porque é que as autoridades de saúde não impedem estas coisas. Pelo que vi nessas pesquisas que fiz, num programa do Goucha há uns anos, o tal Dr. Nina ia mais longe e exemplificava que ao reequilibrar o Sódio e o Potássio das células, repunha os níveis energéticos do organismo (a energia também faz sempre parte do vernáculo da banha-da-cobra, assim como o holístico) e tratava tudo com as suas maquinetas star wars, desde a dor de cabeça, à osteoporose, culminando com a oncologia. E, claro, para ser credível estavam lá doentes ou ex-doentes, assim tipo IURD, que, descrentes na medicina convencional, se entregavam à medicina informacional, com todos os riscos inerentes a querer tratar-se o cancro com feitiçaria.

Pelo que vi pelas imagens da suposta clínica, a coisa deve render bem. Ao menos a homeopatia é um pouco mais benigna, pois normalmente não se afoita tanto deixando as patologias mais agrestes entregues à medicina “convencional”. É que os seus comprimidos de açúcar e xaropes de água não geram tanto impacto no equilíbrio das energias, como as potentes máquinas EMDR da medicina integrativa!

Nada disto se distingue dos efeitos de placebos, conforme comprovam muitos testes por esse mundo fora e na verdade, as ditas “medicinas alternativas”, são alternativas porque não são medicina. Aqui fica uma reportagem, na TV Australiana sobre a homeopatia. Depois é só generalizar para outras banhas-da-cobra, como esta do Dr. Nuno Nina.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Bin Laden e a amoralidade do Obama

Há muito, quem defenda que a Moral tem que ter um fundo supra-humano, no sentido em que defini-la em causa própria seria uma perversão da própria Moral e só algo superior ao Homem pode ditar um conjunto de regras de conduta objectivas e absolutas, que não fiquem ao abrigo do voluntarismo e relativismo de cada indivíduo ou sociedade.


É um tema amplo que carece de vários posts para abordar convenientemente, coisa que irei fazendo ao longo do tempo. Parece-me no entanto evidente que o argumento de uma origem divina da moral, funciona mais como uma fragilidade para o ser humano do que uma força. É no ser humano que temos que encontrar soluções para resolver os problemas que nos afectam e para a definição das melhores regras de convivência entre diferentes credos, religiões, etnias, territórios, etc. E, apesar de tanta violência e intolerância que se vê pelo mundo, nunca fomos mais tolerantes do que agora e nunca se deu tanta importância à aceitação das diferenças como agora. Isso é precisamente o resultado deste processo de ajustamento iterativo, em que se compreende que o respeito pelo outro é a uma forma mais eficiente de desenvolvimento, o que significa que a moral tem que evoluir como tudo o resto, coisa que uma origem divina e dogmática não garantiria, pelo contrário, ao ser absoluta seria imutável. Como disse desenvolverei este tema mais tarde. Para já queria destacar um episódio que se passou anteontem e que, sob o ponto de vista moral, deixou muito a desejar. Falo da morte do Bin Laden e da forma como foi comunicada:

  1. Ao contrário do que estamos habituados, o Obama faz um discurso algo desastrado, em que evoca deus várias vezes, num assunto a que não deveria ser dada qualquer conotação religiosa.
Já estamos habituados a que os discursos nos EUA tenham frequentes evocações de deus e que terminem em “God Bless América”, mas num tema destes, não só se esperaria que o bom senso e tacto habituais do Obama (tão claros, por exemplo, no discurso que fez no Egipto há dois anos, que também envolvia situações delicadas) o evitassem, como deus foi evocado várias vezes completamente sem necessidade. Julgo que isto dará inevitavelmente azo a ódios acrescidos e pretextos aos que querem ver nisto um símbolo de guerra contra o Islão que naturalmente não é, ou um símbolo de arrogância e superioridade de uma religião em detrimento de outra religião que abençoa a Nação Americana, que obviamente também não é; 
  1. Segunda coisa chocante é o regozijo com que se falou da morte do dito terrorista. Claro que o Osama Bin Laden, não faz falta nenhuma à Humanidade, mas falar-se com uma naturalidade tão grande duma morte sem se explicar livre de quaisquer ambiguidades e desde o primeiro momento, que a tentativa era capturá-lo e que acidental e com o intuito de defesa que a morte aconteceu, é algo que só pode contribuir para um agudizar dos sentimentos anti-ocidentais.
É verdade que os Americanos ainda estão traumatizados com o ataque que sofreram há 10 anos e a morte do perpetrador funciona com uma saída do luto. É também verdade que a pena de morte ainda existe em diversos Estados dos EUA e portanto não há uma noção de justiça, do mesmo tipo que para os Europeus, mas mais uma vez é uma grande falta de tacto a secura com que Obama fez este anúncio. Admito que ao revelar esta dureza, possa ter tocado nas comunidades mais conservadoras e eventualmente ter melhorado bastante ao nível do seu posicionamento interno em relação às eleições do próximo ano, mas uma comunicação deste teor, iminentemente ligada às relações externas teria que ser tratada com mais cuidado e obedecer a outros valores; 
  1. Ainda mais surpreendente, ou talvez não, é que por estas bandas, o tom insensível foi replicado e os telejornais que vi abriram todos as notícias, em tom de aclamação com a morte do dito inimigo número um. Como disse o cardeal patriarca de Lisboa, D. Policarpo a este pretexto, a violência nunca é solução e relevar uma tamanha insensibilidade não vai contribuir para nada de bom nesta situação melindrosa; 
  1. Finalmente, o que dizer do que fizeram ao corpo?! Deitaram-no ao mar e não se coibiram de o dizer abertamente. Será que sou só eu a achar isto anormalíssimo. Deitar corpos à água é coisa de filme, mas mesmo tentando pensar à Americana, o que é difícil confesso, até no velho Oeste os cowboys menos abrutalhados não deixavam os corpos dos vilões abandonados no meio do deserto. Neste caso comunica-se que já não há corpo, porque foi deitado ao mar e pronto, os peixinhos e as 72 virgens que se entretenham com ele.
Será sempre inevitável que a morte do Bin Laden venha a fazer recrudescer os sentimentos anti-americanos (aliados incluídos) e a propensão para o terrorismo, mas convenhamos que esta crueza amoral só pode ter piorado as coisas. E era completamente desnecessário. Era só terem-se alterado umas palavritas…

sábado, 30 de abril de 2011

A Nossa relevância...

O meu primeiro post marca uma homenagem àquele que considero ser o maior comunicador científico do séc. XX. Carl Sagan nem sempre foi valorizado por muitos colegas cientistas por, segundo eles, dar demasiada importância à divulgação científica e incorrendo por isso, em excessos de simplificação na linguagem. O tempo veio revelar que Sagan estava certo e hoje a mentalidade de muitos cientistas já não está só centrada no laboratório e no uso de jargão só compreendido pelos pares, havendo um reconhecimento de que divulgar os resultados do trabalho, fora da estrita arena do meio científico é tão importante como o trabalho propriamente dito.
Sagan, não foi de modo nenhum o primeiro a dar importância à divulgação científica, mas talvez ninguém como ele tenha feito disso uma missão e tenha gerado um impacto tão grande no aumento do conhecimento científico da população em geral.

Gostaria de ter escrito o texto que aqui deixo. Brilhante, belo e inspirador! Pode ser encontrado no livro de 1994, “A pale blue dot” e é uma lição de humildade cuja leitura recomendo.